Academia, um local de poucos: sobre racismo e elitismo

Há muitas mulheres atuando em universidades como professoras, pesquisadoras, gestoras. Mas há poucas que alcançam postos de poder e posições mais destacadas. Já falei disso em outro post, considerando que se trata de um sinal claríssimo, entre outros, do quanto a academia é um ambiente machista. Porém, constatar isso é muito pouco. Precisamos reconhecer o quanto a academia é um dos ambientes mais excludentes, mantendo uma aparência de abertura, aceitação e diversidade. Sim, a academia é machista, racista e sobretudo elitista, sendo profundamente estruturada por mecanismos que vão, pouco a pouco, eliminando as chances de mulheres, negros, indígenas, pessoas trans, pessoas que têm alguma deficiência e, principalmente, pobres, de participar efetivamente do campo.

Essa história, lógico, não é nova, mas no Brasil, com a criação das cotas raciais e econômicas, além das bolsas que permitiram que muita gente das classes mais baixas tivesse a chance de cursar um mestrado e um doutorado, o ambiente acadêmico parecia ter mudado um pouco (mudança que, no fim das contas, está sendo mega ameaçada pelas ações desse desgoverno que pilha o país). Quando a gente muda o foco de análise, e passa a usar um filtro mais alargado, a história é outra, ou seja, constatamos que as exclusões continuam muito presentes.

Confesso que a ficha só caiu pra mim com mais clareza agora, em um evento gigantesco nos Estados Unidos, o Congresso da ICA (International Communication Association). O evento acontece em Washington D.C. e eu vim para participar de um painel sobre jornalismo e ativismo. Sinto que é um imenso privilégio estar aqui, por ser da América Latina, mulher, de origem nada abastada, e que segue ralando para alcançar algum lugar ao sol nesse campo da pesquisa em comunicação. Também é uma enorme oportunidade de ver pessoalmente muitos dos figurões cujos textos estão sendo importantes para a minha tese, e principalmente para ouvi-los dizer coisas que corroboram demais com o que estou escrevendo (em outro post vou falar disso). Mas foi meio chocante, em um primeiro momento, quando me dei conta de que estava em uma sala sem nenhuma pessoa negra, nem na plateia, nem entre os palestrantes. E, de novo, em uma nova sessão de trabalhos, apenas uma pessoa negra na plateia. E, mais uma vez, no máximo uma pessoa na audiência. Entre as nove sessões que eu assisti, apenas uma contou com uma pessoa negra entre os painelistas, uma pesquisadora do Kênia, presente porque o tema assim o requeria (falava das diferenças entre Leste e Oeste pós fim da Guerra Fria).

Sessão sobre consumo midiático durante Congresso da ICA, em Washington D.C: mais uma vez, só havia uma pessoa negra na plateia (no cantinho esquerdo da foto), e nenhuma entre os palestrantes

Se estendermos essa reflexão para os autores que citamos nos nossos trabalhos acadêmicos, quantos são negros? Mais ainda, quantos são mulheres negras? Possivelmente, dá para contar nos dedos – fazendo aqui uma autocrítica, eu mesma cito pouquíssimos, ainda que tenha, entre os meus autores prediletos, Stuart Hall, sempre muito acionado. Isso não acontece à toa: simplesmente são poucos os negros que chegam à academia, menos ainda os que concluem um doutorado, e menos menos ainda os que ingressam na elite do campo acadêmico internacional. Como interpretar isso? Racismo.

Acho que estar nos Estados Unidos (pela primeira vez, por sinal) contribuiu para que essa percepção se tornasse ainda mais avassaladora. Afinal, o país tem uma diversidade imensa, e a população negra é praticamente onipresente, mas ocupando determinados postos de trabalho, como no atendimento ao público, servindo nos restaurantes, fazendo a segurança de espaços privados, na polícia e na limpeza das ruas. Será que não haveria pessoas negras norte-americanas interessadas em produzir pesquisa em comunicação? Certamente, há. E, certamente, poderia haver mais ainda. O que parece não haver é abertura no campo para aceitar as diferenças.

As exclusões, como falei, não se restringem ao gênero, à etnia, mas afeta especialmente as condições sociais, o que é delimitado por exigências muito sutis, como a língua e a linguagem. Se é difícil para quem fala inglês, mas não pertence ao “universo” previamente delimitado pelos preconceitos que constroem muros nas relações sociais por razões absurdas, imagina para quem não fala. A academia cria coerções que incluem a adesão a uma determinada linguagem, a determinadas técnicas, a determinados métodos, para que uma produção seja aceita. Mas, para além disso, é preciso ter fluência em outros idiomas, o que nem sempre é fácil para quem é de origem humilde, tem que trabalhar durante o dia e estudar à noite, e ainda virar a noite para concluir uma monografia (esse foi o meu caso). Penso nisso toda vez que dou meus tropeções na língua escolhida para internacionalizar a ciência, mas penso mais ainda que essa obrigatoriedade naturalmente se torna um obstáculo, nutrindo uma natureza excludente que deveria ser incompatível com o espírito acadêmico.

Ah, alguns podem alegar, mas para manter a qualidade, a ciência precisa ser excludente, precisa ser exigente. E quem disse o contrário? Discuto aqui a construção de barreiras que impedem que pessoas com alguma diferença consigam produzir um trabalho de qualidade e se destacar no meio acadêmico. Discuto que as ausências não são coincidência, e sim a materialização das relações hegemônicas que perpetuam as desigualdades. E afirmo que, ao constatar tudo isso, senti vergonha de fazer parte dessa farsa.

Para que mudanças sejam realmente possíveis, é preciso, primeiro, identificar o problema, para em seguida discutir à exaustão possíveis saídas, que certamente deverão passar por mobilizações e luta. Afinal, não serão atitudes individuais, ou histórias de “sucesso”, que farão a diferença, mas a ação política que pressione as instituições a mudar. Por isso, continuarei no campo. Mas não com os olhos vendados, achando que é tudo lindo, divino, maravilhoso. Como as demais esferas da vida pública, a academia é palco de imensas distorções e merece ser criticada e problematizada. Reduzir as desigualdades no meio acadêmico é crucial para reduzirmos, também, no restante da sociedade.

Orientadores fantasmas, sanguessugas e messiânicos

Todos os que já passaram pela experiência de fazer um mestrado ou um doutorado sabem da importância do orientador, para o bem ou para o mal. No meu post anterior, falei de algumas expectativas que devemos ou não ter em relação a esse personagem, mas minha abordagem acabou tendo um viés muito mais positivo, afinal tenho tido sorte, sempre contando com a supervisão de professoras maravilhosas. Infelizmente, essa não é necessariamente a regra, como bem me lembrou a querida Grazi Albuquerque, e por causa da intervenção dela, decidi falar sobre o outro lado dessa moeda, dos maus orientadores.

Todo o problema começa porque, independentemente de ter um bom ou um mal orientador, em geral nós, estudantes de pós-graduação, não temos como saber exatamente o que seria uma boa ou uma má orientação. E justamente por essa falta de conhecimento, acabamos criando às vezes expectativas que não serão atendidas, ou aguentando maus tratos, desaforos ou, o que é até mais comum, o silêncio dos (des)orientadores, o que gera culpa (será que estou fazendo alguma coisa errada? Ou será que estou sendo exigente demais?) e aumenta o sentimento de solidão do orientando.

Esse sentimento se amplia ainda mais pela falta de espaços de troca de experiências entre os pós-graduandos. Trabalhamos sozinhos e acabamos aguentando todas as agruras da pesquisa também sozinhos. Mas não precisa ser assim, e por isso mesmo, sempre que possível, quando encontro colegas que estão no mesmo barco que eu, acabo abordando a relação com os orientadores, o que me permite ter alguma noção das práticas que rolam nesse universo académico. E os relatos não são muito animadores.

A partir desses relatos, pensei em três tipos de péssimos orientadores que são muito comuns. Claro que não são os únicos (não se trata de uma pesquisa a sério, como se diz aqui em Portugal, mas apenas uma síntese feita a partir de impressões), e por isso mesmo peço que, quem tiver outros exemplos, me mande nos comentários do blog, que depois posso até preparar outra postagem com uma continuação dessa reflexão. Então, vamos aos tipos:

  1. Orientador fantasma: aquele que desaparece, não marca reuniões, não orienta, como se não existisse. Pior, não lê os textos que o orientando já escreveu, não dá nenhum retorno. Trata-se de um tipo muito comum, incluindo até figuras de renome, grandes pesquisadores, e pode até “funcionar” com aqueles estudantes mais autônomos, que até preferem fazer tudo sozinhos. De todo modo, trata-se de um tipo bem nocivo, sobretudo para quem precisa de uma atenção maior para tocar o seu trabalho.
  2. Orientador sanguessuga: até pode parecer um bom orientador, é relativamente presente, incentiva o orientando a produzir (e incluir o seu nome nas publicações), mas sem contribuir com uma linha sequer, nem mesmo com correções. O peso de todo o trabalho fica nas costas do orientando, mas quem leva os louros é esse tal orientador. Aqui cabe, lógico, um adendo: é muito benéfico que o pós-graduando faça trabalhos e publique em parceria com o seu orientador, mas o ideal é que esse trabalho seja feito em parceria mesmo, a quatro mãos.
  3. Orientador messiânico: decreta leis e quer que o orientando o siga cegamente, sem permitir nenhum pensamento divergente, crítico. Esse é um tipo mais agressivo, pois pode até perseguir o próprio orientando, boicotá-lo. O messiânico praticamente define a pesquisa que o orientando deve fazer, sem abrir brecha para que ele busque inovações, tenha leituras diferentes, desqualificando toda e qualquer tentativa de o orientando deixar uma marca própria no trabalho. Pode funcionar bem com pessoas que preferem seguir um plano já demarcado, sem surpresas, mas é nocivo de todo modo por se preocupar mais em preparar um seguidor do que propriamente um pesquisador com pensamento próprio.

Claro que essas são generalizações que pressupõem tipos “puros”, podendo haver hibridismos e gradações de cada um desses comportamentos na vida real. Porém, ser um pouco menos fantasma, ou levemente messiânico, não reduz tanto assim o problema. Um mau orientador faz com que o trabalho académico se torne um peso enorme para o estudante, maior do que ele deveria ser, aumentando a ansiedade, a insegurança e a baixa autoestima e gerando uma tensão no ambiente académico que não deveria existir.

A mudança, para evitar que isso aconteça, não é simples, porque passa por transformações não só individuais, mas também institucionais e na própria cultura da academia, que alimenta egos e um estrelato que só existe, no fim das contas, nas cabeças dos que se sentem acima do bem e do mal (mas que, na verdade, só são servidores públicos como os demais). Contudo, vale aqui uma dica: caso você, orientando, se sinta prejudicado ou insatisfeito com o seu orientador, deve conversar com ele, expor o que sente, procurar, sempre que for o caso, as instâncias superiores (como a direção do curso) e, em último caso, pedir para trocar de orientador. Essa é uma situação extrema, porém pode salvar não apenas trabalhos acadêmicos, mas a saúde física e mental do estudante.

A solidão do doutoramento e o papel da orientação

A pesquisa acadêmica não é necessariamente sinônimo de trabalho individual, mas em um doutorado essa relação costuma ser enfatizada. Primeiro porque poucas vezes (falo especificamente sobre as ciências sociais aplicadas) os doutorandos se integram a projetos de investigação mais amplos, repletos de integrantes. O mais comum é cada um construir o seu próprio projeto e encaminhá-lo individualmente. Segundo, porque nem sempre o contexto permite que os doutorandos de uma determinada turma mantenham o convívio mais próximo. Em geral, depois que as aulas terminam, cada um vai para a sua casa, centro de pesquisa ou biblioteca, e vai tocar sua pesquisa sozinho.

Tocar a pesquisa sozinho implica em uma série de coisas, a começar pela gestão do próprio tempo, afinal, como qualquer pessoa que trabalha em casa, podemos tanto trabalhar dia e noite, como também começar a protelar, protelar até sabe-se lá quando. Também implica uma boa organização, a definição de objetivos que possam ser cumpridos e bom senso na execução das etapas empíricas do estudo. Responsabilidades que podemos associar à de um empreendedor que está à frente de um novo negócio, mas que possui uma “clientela” especial, formada grandes especialistas de sua área, que têm o papel de definir se o seu trabalho é o suficiente para lhe atribuir o título de doutor – ou seja, o certificado de que, agora sim, você faz parte do campo acadêmico.

Para completar, todo esse processo de feitura de uma tese de doutorado é bastante longo, durando mais de 3 anos (o meu já passou de 3 anos e meio), o que contribui enormemente para o surgimento de alguns sintomas bastante negativos e alimentados pela solidão.

Em outro post, dei algumas dicas de como sobreviver ao doutorado, mas senti falta de falar um pouco mais do assunto, pois estou vivendo esse sentimento de solidão há algum tempo. Uma sensação que mistura a satisfação de estar com a pesquisa em fase bem avançada, de ver as páginas que vão formar a tese se sucedendo, de sentir que estou realizando um trabalho bacana, com resultados interessantes, mas ao mesmo tempo não ter com quem falar sobre tudo isso e sentir que, ao me calar, me entristeço, vou me consumindo.

Sentir isso faz todo sentido e em doses mais severas, se torna bastante preocupante, como mostrou uma pesquisa da Universidade de Kentucky (EUA) divulgada em 2018, cerca de 39% dos estudantes de doutorado chegam a apresentar sintomas de depressão, desde leve até severa – enquanto a média na população em geral é de 6%. Outros estudos confirmam a tendência à deterioração da saúde mental dos doutorandos.

Nem tudo é tão solitário assim. Trocamos ideias preciosas sobre os nossos objetos nos eventos acadêmicos, onde, na imensa maioria das vezes, pesquisadores mais experientes são super receptivos e abertos a ouvir e opinar da forma mais construtiva possível. Nos eventos também sempre encontramos outros jovens pesquisadores, com quem podemos partilhar nossos anseios, medos e experiências e, com isso, deixar de nos sentir tão sozinhos e incompreendidos.

Acima de tudo, temos o orientador, ou, como no meu caso, a orientadora. A pessoa que conhece seu trabalho tão bem quanto você, e melhor, pois sabe identificar suas fraquezas e suas potencialidades, e que dá os feedbacks da maneira mais sincera possível para que você possa melhorar o que está fazendo, até entregar uma tese digna do nome.

Entretanto, nem sempre estamos lado a lado com o orientador. Inclusive por isso, muitos doutorandos se sentem um tanto abandonados pela ausência de um contato mais frequente e mais caloroso. O que não é necessariamente papel da orientação. Por conta disso, decidi enumerar aqui alguns dos papeis que devemos esperar, e outros que não devemos, da relação com o orientador:

1 – Ler o que o orientando escreveu, corrigindo tanto questões relacionadas à epistemologia, como à metodologia e até à correção gramatical;

2 – Acompanhar o cronograma de trabalho do orientando, cobrando-o sobre prazos;

3 – Apoiar a participação do orientando em eventos acadêmicos, contribuindo na revisão ou até na confecção (em parceria) de resumos, e também, sempre que necessário, enviando cartas de recomendação;

4 – Participar do planejamento do trabalho do orientando, discutindo prazos, quantidade de trabalho e a pertinência de tudo o que está sendo feito;

5 – Não devemos esperar que o(a) orientador(a) se torne um(a) amigo(a) ou pior, pai/mãe. A relação inclui ter empatia e respeito mútuo, mas não necessariamente intimidade e muito menos atitudes paternalistas. Claro que varia de pessoa para pessoa, e há aquelas com as quais nos identificamos profundamente, fazendo com que a orientação depois se transforme em uma grande amizade. Mas, em geral, trata-se de uma relação de trabalho, devemos sempre lembrar disso;

6 – Não devemos esperar que o(a) orientador(a) faça o trabalho para si, indique todos os textos que deve ler, e defina exatamente toda a metodologia que deverá aplicar. Parte do trabalho do pesquisador-doutorando é construir seu próprio caminho, encontrar novas leituras, possíveis metodologias. O(a) orientador(a) vai evidentemente indicar o que considera essencial, mas a investigação jamais poderá se restringir a isso, devendo ir além. Afinal, com acertos e erros, o trabalho é do doutorando.

Portanto, por mais que o orientador seja impecável, acompanhando tudo de perto e dando todos os retornos possíveis, o trabalho de investigação no doutoramento é na maioria das vezes solitário. Não há como mudar isso. E por isso é tão importante permanecer atento ao bem estar físico e mental, ter tempo para se cuidar, para se divertir, para ter hobbies, e para não ser apenas um doutorando.

Encontros à portuguesa

Há dois anos e meio, eu, meu marido e dois filhos cruzamos o Atlântico em direção a um mundo desconhecido, mas ao mesmo tempo tão desejado. Viver em Portugal, afinal, é sonho de muitos, um país irmão com o qual partilhamos a mesma língua e parte da história. Os sustos pelo choque cultural foram inevitáveis, mas logo foram superados por boas surpresas, que vieram no formato de encontros e se tornaram a parte mais encantadora de toda essa jornada.

Compartilho aqui texto que escrevi para a Revista do Dragão v.2, n.2, publicada este ano. Como a versão digital ficou incompleta (e sem o meu texto), decidi disponibilizar minha crônica, que afinal não tem muito a ver com o doutorado, mas ao mesmo tem tudo a ver. Pois tem a ver com as vivências que viver no exterior nos reserva. Aqui vai.

 

Os personagens que apareciam na TV eram os de sempre. Gumball, Darwin, Mordecai, Rigby. Mas o que eles diziam…

– Mãe, ajeita a TV, tá em inglês, não dá pra entender nada.

– Filho, isso não é inglês, é português. Presta a atenção que logo você vai entender tudo.

Isso já aconteceu há dois anos e meio, em outubro de 2015, quando nos mudamos de mala e cuia para o Norte de Portugal, em Braga, para passar uma temporada de quatro anos, o tempo de iniciar e terminar um doutorado – e mais um bocado de coisas.

Lá no fundo da minha alma, eu tinha que admitir, naquele primeiro momento eu também não entendia muitas das expressões que ouvia. Seja na televisão, seja nas ruas. E não só pelo sotaque. Tive uma avó nascida na Madeira que nunca mudou o jeito de falar. Mas não, não era isso. Eram os termos usados. Ainda mais em desenhos animados repletos de gírias e informalidades. “Vá lá, chavalos”, “… que tal ver a malta a passar?”. É, tava difícil de decifrar.

As diferenças, contudo, não param por aí. Até o jeito das pessoas é outro. Meu pequeno, com quatro anos, chega em casa logo nos primeiros dias de escola relatando que um coleguinha, da mesma idade, o estrangulou. Mostrou com as mãozinhas, e com jeito aflito. Fiquei desesperada. Fui à escola, reclamei com a professora. Logo depois, porém, percebi que era o jeito das crianças. Elas adoram abraçar, e fazem isso às vezes com força. Nem eu nem meu filho estávamos acostumados com aquilo. Logo o “estrangulador” se tornou o melhor amigo.

E, se de um lado, adoram dar abraços e distribuir beijinhos, por outro, os portugueses não se acanham ao dar uma boa bronca. Não foi uma nem duas que levei sermão em repartições públicas por algum erro que cometi. Por não saber preencher um envelope corretamente, ao esquecer (ou não saber que precisava de) um documento. A bronca vem sem pena. Mas logo depois de ouvir resignada e pedir mil desculpas pela falha, vem o afago e a tentativa de remediar o problema. “Vamos fazer o preenchimento do envelope deste jeito…”, “me mande o documento que falta por email ainda hoje que incluo no restante da papelada”. Vários jeitinhos que, no fim, tem tudo a ver com o nosso jeitinho brasileiro.

Situada no Norte deste pequeno país, Braga é a antiga capital do Império Romano na Península Ibérica, a Bracara Augusta, há mais de dois mil anos, e é marcada pela cultura minhota, da fronteira entre Portugal e a Galícia espanhola. Por isso mesmo, não é incomum que as pessoas usem o B no lugar do V em diversas palavras, o que ficou consagrado até nuns tradicionais lencinhos bordados, que trazem versos de amor e de saudade.

Uma cidade tão antiga, que preserva tradições tão longínquas, mas que ao mesmo tempo possui um espírito universitário tão jovem. A Universidade do Minho, onde faço o doutorado, tem pouco mais de 40 anos, mas já se tornou uma das mais importantes do país e sempre uma ótima referência por onde passo na Europa.

Viver no Norte não é como viver em Lisboa, onde de tanta gente, de tanto agito, ninguém mais presta muita a atenção aos outros. De repente, ao andar em Braga, percebemos que estamos sendo observados. “Olha, acho que seu marido passou há pouco de carro. Ele até fez sinal para si, mas não o viste”. O aviso veio da dona de uma loja de móveis por onde sempre passo para ir à minha casa, mas com quem eu nunca havia trocado sequer uma palavra.

Outro dia, durante uma crise de tosse do pequeno, eis que toca a campainha. Quando isso acontece, nunca sabemos se é alguém no interfone ou se a pessoa já está na porta de casa, pois é comum que vendedores consigam entrar e fazer essa abordagem mais direta. Fábio abre a porta e eis que é a vizinha, com um vidro cheio de mel. “É para o miúdo, é mel da aldeia, muito bom para essas constipações”. E assim descobrimos que tínhamos ali ao lado quase uma avó preocupada com o neto.

Estar num país estrangeiro como imigrante é muito diferente de ser turista. Dá tempo suficiente de perceber as imensas diferenças culturais que existem, mesmo que a história, a língua e a alimentação nos unam muito mais do que nos separem. Sim, a alimentação. É puro mito aquela velha história de que não tem feijão nem café em Portugal. E no Norte, para quem saiu do Nordeste, há diversos outros pontos de contato: galinha à cabidela (chamada de pica no chão), moela, sarrabulho. A aparência é diferente, mas o conceito do prato e os ingredientes são bem parecidos.

Entre as diferenças, está um certo distanciamento, mesclado a talvez uma desconfiança, que os olhares te lançam no início. Mas logo percebe-se que essa desconfiança dura pouco. Quando começamos a frequentar com alguma regularidade diferentes espaços, seja a universidade, a academia de ginástica, a escola dos filhos, ou mesmo repartições públicas, como as finanças, o centro de saúde e o serviço de imigração, as pessoas passam a se aproximar e a demonstrar curiosidade e afeto.

Um afeto que se exprime em conversas intermináveis, em que se fala de um tudo. Da pena que dá de ver o Brasil viver a situação política e econômica que está vivendo, das dificuldades que ainda persistem em Portugal mesmo depois de abandonar parcialmente a “austeridade”, de como o ensino tem sido desafiado pelas novas tecnologias sempre à mão dos nossos filhos. Ou sobre o jeito certo de preparar rojões (carne de porco picada e cozida) para que fiquem bem macios.

Essas conversas despretensiosas, que abrem pequenas frestas ou às vezes janelas para conhecer melhor o outro, são a maior riqueza desta experiência de vida no estrangeiro. Aos pouquinhos, esses encontros vão nos confirmando que, por mais diferenças que existam, há tantas semelhanças. Sim, o estereótipo de que o português é um povo mais formal do que nós brasileiros se confirma em muitos momentos, mas isso não impede a aproximação. E quando a primeira barreira se quebra, temos a chance de conviver com pessoas com um senso de humor muito peculiar, repleto de ironias e que não preserva nem a si mesmos.

Uma das maiores descobertas desse humor é que praticamente todo português consegue imitar bem o sotaque brasileiro. Até quem nunca pisou do outro lado do Atlântico. Conheci um gaiato (este também é um termo português) que eu jurava ser mineiro lás das brenhas, fazendo comentários sem graça sobre apresentações acadêmicas que assistíamos. Pois bem, o gaiato em questão, “mineiro puro-sangue”, na verdade era do Porto, ali também no Norte de Portugal, e por sinal consegue fazer não só o sotaque mineiro, mas o paulista, o carioca, o baiano. E nós, brasileiros, que não conseguimos nem distinguir, a um primeiro momento, o sotaque de Lisboa da fala do pessoal do Norte, acreditamos piamente que somos fantásticos ao imitar os portugueses.

Encontros acontecem e são repletos de novas histórias, de novas nuances, que vão nos abrindo um pouco este mundo tão familiar, mas ao mesmo tempo tão desconhecido. Mas amizades, daquelas de trocar confidências, de frequentar a casa sem avisar antes, de ligar já na balada para saber “cadê tu?”, essas são mais difíceis. Vejo minha filha mais velha lutando ainda, depois de todo esse tempo, para construir um núcleo de amigos, e não é fácil. Você vai contando nos dedos de uma mão, porque prevalecem as relações mais antigas, de infância mesmo, e quem é de fora chega com tudo já estruturado. Mas certamente isso também é questão de mais tempo, para ir furando aos pouquinhos as camadas de timidez que servem como pequenos obstáculos a serem vencidos. Temos mais um ano e meio para descobrir se é assim mesmo.

 

Pra quem não conhece, aqui estão Gumball & família, pelas mãos do Benício

Cinco dicas para sobreviver a um doutorado

Quem passa por um mestrado já sabe o sofrimento que é se debruçar por dois anos sobre um mesmo objeto, dissecando-o, problematizando-o e sempre, infinitamente, encontrando novas referências que podem mudar totalmente a abordagem que você está fazendo sobre aquele objeto. No doutorado, esse sofrimento é multiplicado por dois, pois são quatro anos e a exigência de produzir algo de excelência é muito maior. Muitas vezes sentimos que se trata da obra da nossa vida, e isso é sério demais, aumentando muito a cobrança que fazemos sobre nós mesmos.

E daí que não é nada incomum que muitas pessoas, durante o doutorado, acabem iniciando, ou piorando, processos depressivos, ansiedade, pânico. Há quem se divorcie, ou decida abandonar tudo e mudar totalmente o tema, e muitos desenvolvem problemas de saúde que depois se tornam crônicos, como hipertensão. Até a quantidade de fios brancos na cabeça e de rugas pelo rosto se alastra – não, isso é só culpa da idade mesmo.

Enfim, trata-se de um período muito solitário, já que desenvolvemos esse grande projeto sozinhos – por mais que o ou a orientadora esteja presente. O cotidiano é solitário e nem sempre temos com quem conversar sobre o nosso trabalho, para falar das descobertas, dos impasses, dos desafios. E, ainda por cima, temos de gerir nosso tempo de leitura, de escrita, de trabalho empírico, os eventos académicos que vão surgindo, o aprendizado de línguas, de softwares de apoia à pesquisa, manter a leitura em dia, e ainda acompanhar a realidade do nosso país, do mundo. E ainda ser mãe, esposa, filha, cuidar da casa, da roupa, da própria saúde…

Para não surtar, venho desenvolvendo algumas atividades que acabam me fazendo bem e que tem me ajudado a não me sentir tão cansada com o doutorado. Fiz uma lista e vou compartilhar, com a ideia de quem sabe servir de apoio para outras pessoas que estão no mesmo barco. Vamos lá.

  1. Arranjar um hobbie, em especial se for um trabalho manual. Algo que dê prazer, que ocupe de algum modo seu tempo livre, para que não fique só na frente do computador com raiva do que vê no Facebook. Eu comecei a fazer bordados e depois voltei para o crochê. Faço quando estou com a cabeça pesada de tanto pensar. Melhor coisa do mundo.IMG_20180925_163101
  2. Não deixar de fazer exercícios físicos. Parece clichê, mas não é: a cabeça pensa muito melhor quando o nosso corpo está bem. Não precisa virar um atleta de competição. Mas não dá pra ficar parado. Eu comecei a frequentar uma academia (ginásio, em Portugal), mas ainda assim me custava, eu não gostava de ir. Agora me encontrei no pilates e na yoga. Conto os dias para ir lá me esticar um pouco. O importante é fazer algo para deixar o corpo em movimento, e mais ainda se gostar, mantendo uma rotina.
  3. Ler literatura, e não só textos acadêmicos. No doutorado, lemos sem parar, não só quando estamos fazendo uma revisão de literatura. É o tempo todo. E cansa. Você começa a ser até mais pragmático, lê o resumo, as conclusões e de alguns textos vai ler o miolo, para encontrar algo que pode ser muito útil. Esse tipo de leitura não dá prazer, é funcional. Mas ler é muito prazeroso, e não podemos esquecer disso. Não me tornei uma máquina de leitura, mas quase todas as noites, na hora de dormir, leio um pouco, e nisso já li alguns livros fantásticos ao longo do meu doutorado. Vale demais a pena.
  4. Reservar ao menos um dia da semana para não fazer nada. Bem, eu não diria não fazer nada, exatamente, porque quem tem filhos como eu sabe que isso é quase impossível. Mas é sair, aproveitar o dia de sol, ir ver os amigos, sem pressa e sem aquela pressão de ter que estar trabalhando. É seu dia de folga, mais do que merecido.
  5. Escrever um blog para desabafar sobre a tese. Esse foi o meu caminho para suprir a falta de ter com quem conversar mais longamente sobre o que eu estava fazendo. Pode ser um diário pessoal também, que ninguém leia, mas estabelecer algum nível de diálogo, mesmo que seja consigo mesma, é de certo modo acalentador e nos ajuda a refletir sobre o próprio processo de construção da tese.

Fora tudo isso, recomendo que se escreva a tese desde sempre (já falei um pouco sobre a escrita acadêmica num texto anterior). Mesmo que não seja um texto acabado, pronto para ser o texto final da tese, sentir que estamos escrevendo já nos dá confiança de que tudo vai terminar bem. E ter sempre a certeza de que este não é “o” trabalho da sua vida. É um dos primeiros como acadêmico. Então, vai ser imperfeito, incompleto, passível de receber críticas. Mas vai ser um trabalho respeitável, relevante, que vai trazer contribuições para o campo acadêmico e, quem sabe, para a sociedade. Nem que seja uma contribuição pequenina, mas estará lá. Manter a autoconfiança e a autoestima é ultranecessário em qualquer trabalho, ainda mais ao desenvolver um projeto tão grande como é uma tese.

O texto acadêmico

Adoro ler e escrever. Quando pequena, nutria diariamente um diário, à mão, para refletir sobre os acontecimentos do dia. Amava quando tinha que fazer uma redação como tarefa escolar e logo cheguei à conclusão de que não queria tratar doentes, mas sim escrever, e por isso decidi ser jornalista.

Mas gostar de escrever (e de ler) não significa que automaticamente a pessoa escreva bem. Acredito em talento, mas acredito acima de tudo em prática, e em uma boa aplicação da técnica. No jornalismo, demorou um bom tempo para eu sentir alguma segurança na hora de colocar em palavras o que eu havia apurado naquele dia. Mesmo fazendo isso todos os dias.

Ao migrar para o mundo acadêmico, em um primeiro momento pensei que seria bem fácil, já que escrever era parte da minha rotina profissional. Não devia ser tão diferente assim, pensei de cara. A primeira chacoalhada, porém, não demorou a acontecer: quando eu preparava o projeto da minha monografia, ainda na graduação, a querida professora Júlia Miranda, uma mestra na pesquisa em Sociologia, foi firme: “Eu não quero texto jornalístico. Quero um texto acadêmico. Faça tudo de novo”.

Foi só então que me toquei que a diferença entre esses dois tipos de texto é abissal. Enquanto no jornalismo precisamos ser concisos, resumir tudo em poucas palavras (apoiados, muitas vezes, no senso comum, para facilitar a compreensão), na academia precisamos esmiuçar cada conceito, explicar tudo, buscando autores para embasá-lo, e tentar ao máximo se afastar do senso comum. Enquanto no jornalismo nos satisfazemos com declarações para provar o que estamos afirmando, na academia precisamos articular as ideias, os conceitos, contrapor vertentes diferentes, enquadrar a argumentação em uma corrente teórica. Não basta inserir uma coleção de citações (como infelizmente fazem alguns pesquisadores); um texto acadêmico produz conhecimento, e o faz a partir dessa prática de articulação. Sem isso, trata-se apenas de reproduzir o que os outros já disseram, o que é insuficiente.

Não vou nem me ater tanto à questão do estilo do texto – bem mais formal, na academia, do que no jornalismo – porque acredito que esse nem é o principal problema. De todo jeito, eis mais um desafio, já que acaba sendo até fácil fazer um texto acadêmico repleto de jargões e sequências textuais incompreensíveis (e talvez muita gente coloque isso como meta, para parecer que fez um texto mais profundo, ou se sentir mais inteligente). O texto acadêmico, contudo, precisa ser compreensível a qualquer pessoa, mesmo a quem não é propriamente daquela área de estudos, sem ser simplista. Comunicar da maneira mais clara, incluindo o conteúdo mais interessante e amplo possível, é um grande desafio.

E eis onde quero chegar: os objetivos do texto acadêmico são bem diferentes dos objetivos do texto jornalístico. E por isso é que, essencialmente, são textos diferentes. Enquanto o texto jornalístico tem como objetivo principal informar sobre um determinado acontecimento, em acordo com determinada linha editorial, e precisa fazê-lo de um modo suficientemente atrativo, para conquistar a audiência, o texto acadêmico tem como objetivo relatar os percursos e os resultados de uma pesquisa científica, o que o faz tanto a partir de reflexões teóricas, especulativas, e do relato sequenciado de estudos empíricos, cujos resultados levam a novas reflexões teóricas. Resultados que, assim, contribuem para o desenvolvimento do campo de estudos em que o trabalho se insere, levando à proposição de novos rumos de pesquisa, ou de mudanças/confirmações de paradigmas, que podem ser posteriormente convertidos em produtos e políticas públicas, que podem até gerar transformações sociais.

Por tudo isso, acabei tendo que reaprender a escrever. E sigo na luta, pois não é fácil incorporar tantas alterações num corpo já habituado ao texto fluido do jornalismo. Nesse percurso, vale recorrer a ajudas. Uma delas que recomendo muito é o livro de Howard Becker, Truques da Escrita, que traz algumas dicas bem legais. Uma delas é escrever, mesmo quando você se sente meio bloqueado, ou até sem paciência pra ficar coletando autores para compor suas ideias. Depois de tantas leituras, de tantas conversas com o (a) orientador (a), temos muita coisa na cabeça e a melhor coisa é ir colocando no papel (ou no computador). Depois fica bem mais fácil fazer as articulações, mudar de lugar, cortar, inserir novas ideias.

Outra coisa muito boa a fazer é ler prestando atenção à técnica aplicada por outros autores. Veja como os argumentos são montados, como apresentam cada parte do trabalho, desde a introdução, as justificativas, os objetivos, as hipóteses, a metodologia (e os métodos), os resultados da pesquisa empírica e a discussão desses resultados. Veja até de que modo montam cada parágrafo (iniciando com a ideia geral, e depois abrangendo para trazer detalhes, especificações, exemplos) e ordenam a sequência de parágrafos. Mas é bom focar em quem escreve bem. O mundo acadêmico está repleto de textos bem ruins.

Enfim, tudo isso na teoria é muito fácil, mas na hora de sentar e escrever uma tese, são outros quinhentos. O branco da tela assusta e muito, mesmo quando você sabe que tem sei lá quantas páginas de fichamentos, mais sei lá quantas páginas de transcrições, e tem certeza de que está tudo na cabeça. Em outro momento conto como estou fazendo com a minha. Só antecipo que, na hora do “branco”, volto a dar uma de jornalista. Lembro que tenho um deadline curto e começo a escrever partir “do meio”, deixando o começo para depois.

Quantitativa ou qualitativa, eis a questão

Iniciar uma trajetória acadêmica nos leva a fazer uma série de escolhas, e nisso acabamos, muitas vezes, por tomar partido de algumas perspetivas e, na mesma medida, demarcar alguns preconceitos. Muitas dessas escolhas ultrapassam os recortes teóricos, e nos perseguem nas definições metodológicas, o que nos leva, muitas vezes, a querer demonizar uma pesquisa puramente quantitativa, ou uma que tenha sido feita apenas com métodos qualitativos, a depender de que lado nos posicionamos.

Assim, de um modo geral, para analistas do discurso, os estudos baseados em uma análise de conteúdo clássica (ou seja, quantitativa) são em geral pobres, por não se restringirem à superfície do que está escrito; do mesmo modo que analistas de redes sociais, que usam métricas quantitativas para estimar participação e engajamento, entre outros parâmetros, podem considerar insipiente uma pesquisa etnográfica que acompanhe um pequeno grupo online e que privilegie, no lugar da quantidade das interações, o teor do que tratam e de suas reações.

A polêmica entre a pesquisa quantitativa e a qualitativa não é nova e abrange diferentes disciplinas, em diferentes situações, geralmente associando a pesquisa quantitativa a uma maior objetividade científica, que permite fazer maiores generalizações, o que, por sua vez, é associado a uma visão mais conservadora (e até de “direita”), enquanto a pesquisa qualitativa é vista como mais humanista e crítica, menos determinista e mais profunda, sendo associada a posicionamentos “progressistas” ou de “esquerda” (coloco todos esses termos entre aspas por terem diferentes compreensões – e porque não vou discuti-los aqui). Como falei, essa é uma questão bem polêmica, e certamente nem todo mundo precisa concordar com minhas impressões.

Nas Ciências Sociais, a divisão é bem evidente: enquanto a tradição da sociologia, com base sobretudo em Durkheim e Weber, enfatizou a pesquisa quantitativa – para compreender comportamentos recorrentes em determinadas sociedades, a antropologia focou no olhar sobre pequenos grupos, na abordagem etnográfica, na escrita de diários de campo – também para identificar recorrências, mas chamando atenção para as especificidades, as distinções em menor escala. O que é melhor? O que é pior?

Filha das “humanas”, minha tendência natural é entrar no time da pesquisa qualitativa e pronto, sem grandes questionamentos. Afinal, os grandes questionários são generalizações forçadas, mostram padrões que depois não se sustentam na prática, já que a realidade é muito mais fragmentada do que os grandes inquéritos nos fazem crer, e não somos números, somos humanos, multifacetados, incoerentes, e tudo o mais que a complexidade de viver em sociedade nos leva a ser. Mas, bem, pensando bem, não é bem assim.

Muitas e muitas vezes, a busca por padrões gerais, tendências, recorrências generalizadas, pode ser uma boa maneira de se aproximar do objeto de estudo, até para depois buscar compreender especificidades, diferenciações, subjetividades. Mesmo quando partimos de um caso específico, é interessante contrapô-lo com dados mais gerais, relacionados à situação em que ele se encontra, até para poder dizer que aquele caso específico é diferenciado mesmo ou não – e porquê. Como demarca bem Simone de Beauvoir, sempre traçamos dialogismos, e em geral fazemos isso com base em generalizações, que são sim redutoras, mas que podem nos levar a aprofundar certas reflexões. Não precisamos parar nos números.

No fim, o melhor é tentar superar essa dicotomia entre quantitativo e qualitativo e procurar identificar a melhor metodologia possível para responder as questões de investigação formuladas. Há perguntas que buscam respostas gerais, abrangentes. Há perguntas que buscam o específico, o distintivo. E isso pode ser feito por diferentes caminhos, que podem ser exclusivamente qualitativos, quantitativos, ou combinar métodos de diferentes naturezas.

Exemplifico com a minha pesquisa. Minha pergunta principal me leva a fazer uma pesquisa qualitativa – escolhi aplicar uma análise semiótica multimodal em vídeos. Porém, para chegar à resposta principal, entendo que é necessário também responder a questões secundárias, que me fazem, por exemplo, contextualizar o objeto, quantificando-o de certo modo, ao detalhar algumas de suas características mais “gerais”. Por causa disso, acabei tendo de fazer um questionário online, cujos resultados são em sua maioria quantitativos. O que me levou surpreendentemente a usar um programa de análise estatística que eu jurava que nunca ia precisar usar (o SPSS, que é mais um daqueles softwares que ajudam muito). Só que esses números são apenas uma pequena parte do meu trabalho, que me dão uma visão geral sobre os grupos que estou analisando, e me levam a querer aprofundar as reflexões por um viés qualitativo, de modo a explorar toda a heterogeneidade do meu objeto, a sua riqueza.

Diante disso, fica a dica para quem vai se enveredar pela pesquisa acadêmica: coloque seus preconceitos no bolso e não perca a oportunidade de aprender diferentes métodos de abordagem.

Marielle Franco e Mmame Mbage, presentes!

O assassinato da vereadora Marielle Franco na noite da última quarta-feira, dia 14 de março, no Rio de Janeiro, repercutiu com um toque a mais de indignação na Espanha. Isso porque um imigrante do Senegal, Mmame Mbage, de 35 anos, morreu um dia depois, no início da noite do dia 15, ao ser perseguido por policiais no coração de Madrid.

Aparentemente a morte de Mbaye foi por ataque cardíaco. Mas isso não impediu que milhares de pessoas acusassem a polícia madrilena de assassinato. Em protestos tanto na quinta, dia 15, como neste dia 16, manifestantes gritavam “Polícia assassina” e “A polícia tortura e assassina”, entre outros gritos de indignação. Em paredes e na porta de alguns comércios, viam-se colados panfletos que diziam “Mmame Mbage presente!”, em clara associação à morte de Marielle.

IMG_20180316_180153.jpg

Vivendo há 12 anos na Espanha, Mbage permanecia ilegal, mesmo depois de inúmeras tentativas de regularizar os “papéis”. O que acontece, segundo relatos de amigos que falaram a periódicos locais, entre eles El Salto, por obstáculos impostos pelo próprio serviço de imigração.

Ilegal, Mbage trabalhava como vendedor ambulante ou fazendo pequenos bicos temporários. Apesar das dificuldades, era querido não só pela comunidade senegalesa, mas também engajado com os demais ambulantes, participando até de uma organização sindical criada para defendê-los.

A própria gestão do ajuntamento de Madrid admite que, no dia em que Mbage morreu, a polícia cumpria uma ação de retirada dos vendedores que atuam no centro de Madrid, vendendo réplicas de bolsas e outros produtos em tapetes no chão, os chamados “manteros”. Só não admite que a polícia possa ter errado, ao perseguir por vários quarteirões os vendedores. Testemunhas dizem ter visto Mbage correr ao ser perseguido por policiais sobre motos, até não aguentar mais.

A manifestação do dia 16 começou em uma praça emblemática para a comunidade negra madrilena, a Praça Nelson Mandela, no bairro de Lavapiés, a poucos metros de onde Mbage morreu. Milhares de pessoas participaram do protesto, mesmo sob a coação da polícia, equipada com inúmeros carros, helicóptero e armas. E mesmo que, no dia anterior, logo após a morte do vendedor ambulante, a revolta espontânea da comunidade local tenha sido calada à base de cassetetes e tiros de bala de borracha atirados pela polícia.

IMG_20180316_184718.jpg

Além de acusar a polícia, a comunidade que se manifestava também repelia qualquer tipo de racismo e denunciava a criminalização dos imigrantes. “Nenhum ser humano é ilegal”, gritavam.

IMG_20180316_181816.jpg

IMG_20180316_182430.jpg

O racismo, por mais irracional que seja, segue sendo um dos mais graves problemas vividos na contemporaneidade. Ao que se soma a pobreza, o sexismo, a ganância e a falta de empatia e de senso de justiça que povoa as mais diferentes sociedades, em nome de valores tão egocêntricos, como o nacionalismo e o dinheiro.

Por isso, a indignação vivida por causa da morte de Marielle, no Brasil, e de Mmame Mbage, em Madrid, precisa ser expandida, ganhar volume, alcançar outros espaços, outras dimensões. Essa indignação precisa ser motor de resistência, para quem sabe gerar mudanças. Porque não dá mais para aceitar tanta desumanidade.

Claro que são duas mortes que aconteceram em contextos diferentes, em países diferentes. Mas que tem a violência policial contra negros como ponto em comum. E a revolta contra esse ponto comum me fez sentir, ao participar do protesto contra a morte de Mbage, como se estivesse me manifestando contra todas as mortes violentas sofridas por negros e pobres no Brasil. Contra o assassinato de Marielle. Porque, no fundo, somos todos gente, que merecemos boas condições de vida, oportunidades, tudo o que está sendo negado há tempo demais contra uma enorme parcela da população só por causa da cor da pele.

Comunicação popular e alternativa e o papel da proximidade

Há duas semanas, iniciei minha jornada em Madrid, onde fico por três meses para complementar minha pesquisa de doutorado. É como um doutorado sanduíche, que tem no Brasil. Neste percurso, tenho como tutor o professor Alejandro Barranquero, da Universidad Carlos III de Madrid (UC3M). E nesse tão pouquinho tempo, já tive acesso a algumas experiências de comunicação alternativa e popular tanto aqui da Espanha, como da América Latina. Uma comunicação marcada pela proximidade, acima de tudo, e que tem tudo a ver com meu objeto de estudo, o jornalismo alternativo.

A primeira experiência foi um documentário chamado Experimenta Distrito. Tive a chance de ver a estreia do filme de graça no dia 10/02, na Cineteca do centro cultural Matadero, em uma sala lotada de gente que havia participado de alguma forma daquela produção. Não como realizadores do filme, mas como “personagens” reais responsáveis por colocar em prática os projetos que estavam sendo retratados na obra.

 

IMG_20180209_182621_557.jpg
Sala da Cineteca do Centro Cultural Matadero

 

As diretoras do filme, Cecília Barriga e Raquel Diniz, também estavam presentes e participaram de um debate logo depois da exibição do filme. O documentário tinha um objetivo claro de registrar a execução de um programa de construção de projetos coletivos, solidários, o Experimenta Distrito, criado para fortalecer a identidade dos distritos (bairros) de Madrid, a partir da criação de laços sociais entre os moradores. Tudo era pensado e executado pelos moradores locais, sob uma orientação inicial de mediadores, e com muito debate, troca de ideias e apoio mútuo. Entre os projetos criados estão uma rádio comunitária, uma horta e um jardim público, uma rede de acompanhamento e cuidado dos idosos, a sinalização de um percurso que levava à escola, para torna-lo mais alegre e seguro. Ideias que se tornaram reais pelas mãos daqueles moradores.

Sentada em meio àqueles desconhecidos, aos poucos eu ia identificando os que estavam ao meu lado, ao vê-los em ação na tela. E os via sorrindo, não por vaidade, mas porque estavam orgulhosos do que tinham feito. Assim, mesmo não tendo sido feito pelas mãos da população que estava à frente dos projetos, o filme acabou se tornando parte do programa Experimenta, como um momento de celebração coletiva, mas também de reflexão, de memória e de compromisso para que ele tipo de atitude se repita. Porque, como disse uma das participantes durante o debate pós-exibição do filme, a experiência mostrou que a ação cidadã precisa mudar, ser mais ativa, criar demandas ao poder público e até colocar a mão na massa, quando há o interesse coletivo. Não que isso vá isentar o poder público de fazer as coisas: pelo contrário, vai pressionar a também agir, em resposta à ação cívica. Uma mensagem que reforça a impressão de que a saída para fortalecer a cidadania é mesmo pela comunidade, ou seja, pelas relações de proximidade, fortalecidas pelo interesse de fazer o bem comum, como tem defendido a professora Cicilia Peruzzo.

Dia 13/02 foram relatos da América Latina que me tocaram, em uma palestra na UC3M em que participaram a ativista e realizadora argentina Paula Kuschnir, que integra o coletivo Wayruro de Comunicação Popular, o professor Ramón (Moncho) Burgos, da Universidad Nacional de Salta, no norte da Argentina, e Daniel Muñoz, doutorando em comunicação e que desenvolveu projetos de comunicação comunitária em audiovisual em Cuba. Foram três relatos diferentes, mas que reforçaram as potencialidades das práticas comunicacionais próxima das comunidades.

 

IMG_20180213_173911.jpg
Daniel, Paula e Moncho, logo após a palestra na UC3M

 

Paula falou um pouco da experiência do Wayruro, um coletivo que já tem 23 anos de existência, e que atua especificamente no norte da Argentina, em Jujuy. A atuação é bem próxima dos movimentos sociais e a ideia do grupo é ser mais do que um meio de produção, mas uma semente que espalha a comunicação, que facilita o acesso às ferramentas comunicacionais, ao realizar capacitação, pesquisa. Fazendo que com o produto dessa comunicação seja um elemento que contribua de fato para determinada luta social, inclusive na gestão e no planejamento dessa luta, como um meio de diagnóstico para ações estratégicas.

Moncho falou um pouco da necessidade de se discutir a comunicação popular e alternativa na universidade. No curso em que atua, ele conseguiu criar uma cátedra específica sobre o assunto, inserida no curso de jornalismo, o que tem contribuído para desconstruir a ideia de que a formação em jornalismo deve ser somente voltada para o mercado, para as redações comerciais. Não, profissionais da área também podem atuar justo a comunidades das mais diversos matizes, mas, para isso, é importante ter em mente que não deve chegar ali com um discurso paternalista de “dar voz aos sem voz”, repassando seus conhecimentos unilateralmente, como se aquela comunidade fosse só um objeto. Não, a comunidade é sujeito, tem conhecimentos relevantes e deve ser empoderada pelos meios de comunicação populares e alternativos, não objetificada.

Daniel, por fim, falou de sua experiência em Cuba, onde estudou audiovisual e contribuiu em projetos que desenvolveram documentários comunitários. Um deles, “7 y 50” (2015), apresentava relatos de moradores de uma comunidade rural que eram contrários ao fechamento de uma fábrica de conservas, onde muitos ali trabalhavam. O documentário foi exibido em um canal de televisão, gerou comoção e, com isso, o governo cubano decidiu desistir de fechar a fábrica. Daniel falou também de outro projeto cubano, “Camara Chica”, uma produção toda realizada por crianças, como mostra este vídeo sobre os bastidores do filme.

Por fim, assisti outro documentário, mais uma vez na Cineteca do Matadero, desta vez produzido nos Estados Unidos, “Radio Unnameable” (2012), que conta a história de um locutor de rádio, Bob Fass, que tinha um programa todas as madrugadas na rádio novaiorquina WBAI desde os anos 1960. Pelas ondas do rádio, Bob acabou construindo uma comunidade também offline que, em mais de um momento, se mobilizou, integrando ativamente, por exemplo, as manifestações contra a guerra do Vietnã, pela paz. As ações offline mobilizadas pelo programa de rádio foram múltiplas, começando com uma festa no aeroporto, passando pela limpeza de ruas públicas que estavam lotadas de lixo, e culminando com protestos. Sendo que a rádio e Bob não eram os organizadores, mas o espaço em que essa organização tomava corpo pela participação coletiva.

Todos esses relatos trazem experiências comunicacionais muito diferentes, mas com pontos em comum. O principal, acredito, é a clara relação que a comunicação precisa ter com a comunidade, com as pessoas que compõem o seu entorno. Comunicar significa se relacionar, ter vínculos, e isso não se dá unilateralmente. É preciso reciprocidade, participação, para ser uma comunicação efetiva. E quando falamos de processos comunicacionais alternativos ou populares (termo usado preferencialmente por Paula, a partir do que traz Paulo Freire), essa proximidade se impõe como algo ainda mais necessário. É vital para a existência de uma comunicação alternativa. O que inclui o jornalismo alternativo. Não dá para falar sozinho, nem falar pelos outros simplesmente, quando a proposta é alternativa. É preciso estabelecer diálogos. Afinal, como apresentou Paula, pela perspectiva de Paulo Freire, a comunicação popular é participativa, política, contrainformacional e libertária. Não podemos esquecer disso.

Sobre o direito de dizer não, no jornalismo e na academia

No meu texto anterior, eu falei sobre o direito, e até mesmo o dever, de o repórter perguntar o que acredita que deve perguntar, mas acabei por deixar de lado o inverso, o direito de o entrevistado de decidir se quer responder ou não. O que pode parecer óbvio, mas não é.

Falar ou não falar é assumir posicionamentos, a partir de determinados interesses, e cada um é que sabe se ter visibilidade será ou não positivo para a sua trajetória. E essa reflexão se dá a partir de um direito básico, afinal, certamente, ninguém é obrigado a falar. Garante-se o direito ao silêncio até diante do júri, ainda mais diante de um jornalista. Claro que sob figuras públicas, que lidam com dinheiro público, recai uma pressão maior para que falem, afinal o princípio à publicidade (não à autopromoção, mas à prestação de contas) é uma das diretrizes do serviço público. Mas esse direito pode ser cumprido de várias formas, como a divulgação de notas, documentos, tabelas, memorandos. Enfim, no fim das contas, garante-se sempre o direito de a pessoa não falar. E o jornalismo precisa respeitar isso – o que não significa se conformar: há sempre outras fontes possíveis que podem ser buscadas para se chegar à informação.

O mesmo se repete com a pesquisa acadêmica. Não é porque eu tenho ótimas intenções, por estar desenvolvendo uma pesquisa de doutorado que considero relevante e que, acredito, poderá gerar bons frutos para melhor compreender a prática do jornalismo alternativo, que todos que eu procurar são obrigados a falar comigo sobre o assunto. Não são. Mas, tudo bem, não são obrigados, mas se são jornalistas, que lidam cotidianamente com a procura de fontes e com a necessidade de que elas disponham do seu tempo para lhes fornecer informações relevantes, que depois resultem em matérias, por que alguns dizem não?

Me deparei com essa realidade nas últimas semanas. Estou em uma etapa da minha pesquisa em que entro em contato com grupos de jornalismo alternativo e peço que a pessoa responsável por dirigir o meio responda algumas questões. Nada muito complicado nem demorado. Pensei que fosse ser algo fácil, tranquilo, já que são grupos muitas vezes pequenos e formados por jornalistas, pessoas que lidam com a busca por informações todos os dias, mas não. Está sendo bem mais difícil do que eu pensava.

A começar pela dificuldade em falar com os grupos. Todos disponibilizam algum canal de comunicação, seja por email, mensagem pelo site do grupo ou pelas redes sociais. Ok, os canais estão lá, à disposição, mas responder que é bom… Só uma minoria dá retorno com alguma agilidade. Há os que demoram um tempo, o que significa até duas, três semanas, para perceber a tentativa de contato e respondem. E há os que não dão qualquer sinal de vida, a maioria.

Entre os que respondem, felizmente a imensa maioria é bem receptiva. Aceita colaborar de bom grado e até demonstra curiosidade pela pesquisa, quer mais informações. O que é fabuloso. E isso acontece independentemente do tamanho do grupo: há desde os bem pequenos, até os bem estruturados e com uma grande quantidade de funcionários (quando eu finalizar a pesquisa, disponibilizarei todos os resultados aqui no blog).  Mas há também o que dizem NÃO.

Não porque, alegam, concluíram que não teriam como atender tantas demandas por entrevistas e de pesquisas acadêmicas que chegam a eles. Bem… fico só imaginando, diante desse universo relativamente novo, e ainda mais novo na pesquisa acadêmica interessada nos media alternativos ibero-americanos, quantos pedidos de entrevistas e de solicitação de dados são feitos por dia para que esses grupos tomassem esse tipo de decisão?

Tá, não sou intolerante e realmente respeito o direito a livre manifestação de todos. E acredito que boa parte da rejeição em contribuir para trabalhos acadêmicos deva-se a uma falsa impressão de que são trabalhos inúteis, que não servem pra nada. Mentalidade que, infelizmente, está impregnada na cabeça de muita gente, e que justifica, por exemplo, a retirada massiva de recursos que tem sido feita no atual governo Temer, com um quase completo desmonte do CNPq e da Capes.

Por menor que seja uma contribuição acadêmica, ela é potencialmente transformadora, por apresentar interpretações aprofundadas sobre um certo fenômeno, ou cenário, o que pode levar a repensar caminhos e estratégias. No caso do jornalismo alternativo, espero que meu trabalho contribua para tornar esta prática mais acessível para uma parte mais ampla da população, e mais respeitada no próprio campo jornalístico, que hoje tende a deslegitimá-la.

Só que, como no jornalismo, nas ciências sociais aplicadas, se faz bem pouco sozinho. É preciso cooperação, conversas, discussões. Um não contribui bem pouco para aprimorar qualquer trabalho.